quarta-feira, outubro 04, 2006

Alcobaça, Arqueologia Medieval e Conteúdos Culturais

Numa navegação pela Internet à procura de informação deparei com o documento aqui linkado e que tem uma significativa importância para todos os que têm interesse pela história local. O autor como irão ver é Pedro Gomes Barbosa, historiador, professor universitário e arqueólogo. É o autor de uma das mais importantes obras sobre o período medieval na região Oeste e responsável pelas escavações de Parreitas, no Bárrio.
A ligação a Alcobaça é profunda como ficou demonstrado numa obra recente sobre a Agricultura nos Coutos de Alcobaça publicada em parceria pela Câmara Municipal e Associação de Agricultores da Região de Alcobaça. A obra é uma síntese histórica e etnográfica interessante e com o aliciante de possuir factos até aqui desconhecidos.
Regressando ao documento que aqui nos traz, começar por dizer que será de 1990. Era muito jovem para acompanhar estes movimentos e talvez por isso tenha lido com algum espanto a referência ao “Projecto de Arqueologia Medieval do Couto de Alcobaça”. Não sabia da sua existência. Em 1990 dizia o autor “que ainda não ultrapassou o estado embrionário, procedendo-se ainda ao levantamento sistemático de campo (juntamente com o trabalho de gabinete) para que possam ser definidos os primeiros objectivos e escolhidas as primeiras estações a escavar” (p. 8-9).
Ainda mais importante é a referência seguinte de que “Este projecto de arqueologia medieval para Alcobaça não nasceu de forma autónoma, mas, antes, fazia parte de um outro mais amplo, iniciado em 1981: o Plano Arqueológico de Alcobaça”.
Não vou avançar em explicações sobre o estado destes planos porque não conheço em profundidade todo o histórico dos acontecimentos. Uma vez que o panorama é mais ou menos semelhante em todo o lado avanço com algumas considerações genéricas de como muitos destes planos não chegam a ser concluídos. Em primeiro lugar porque isso é uma impossibilidade total, por mais que se trabalhe surgem sempre novas possibilidades. Em termos práticos os projectos perdem força ou terminam pelos seguintes motivos:
1. Geralmente são iniciativas e esforços pessoais de investigadores, arqueólogos e meros curiosos. Quando as pessoas se cansam ou seguem novos rumos profissionais há uma ausência de liderança e principalmente de competências.
2. São conceitos sujeitos à apreciação política de executivos autárquicos (que têm legitimidade para o fazer mas que raramente conseguem ver mais do que a despesa inerente aos projectos.
3. Dificuldade de apresentar resultados por parte das equipas técnicas que trabalham no terreno que levam à incompatibilização com os decisores políticos.
4. Falta de condições de trabalho (logística e recursos humanos) dos gabinetes locais de arqueologia. Em alguns locais do país passam o seu tempo em escavações de emergência.
5. O prolongar dos projectos por dezenas de anos retira-lhes capacidade de comunicação com as populações e com as autarquias. A partir desse momento tornam-se vulneráveis e dispensáveis.

Não sei o que se passou no caso concreto de Alcobaça, se foi algum destes motivos ou não, mas custa ver morrer ideias ou projectos desta relevância. O país tem feito um investimento considerável nos domínios da promoção e comunicação da sua cultura, mas corremos o risco de atingir o esgotamento dos conteúdos que dispomos. A produção de conteúdos implica investigação, filtragem e a sua passagem à fase de projecto. Depois disso temos ao dispor recursos com possibilidades educativas e económicas, principalmente para o Turismo.
Apostar no Turismo Cultural passa por enfrentar esta realidade delegando competências e recursos para projectos de investigação. Naturalmente esta é uma função dos organismos públicos, mas não pode nem deve ser um exclusivo seu. O trabalho das associações de defesa do património, um pouco por todo o lado, demonstra esta virtude que existe no nosso sistema. Usando e abusando, no bom sentido, dos contactos humanos que dispõem vão conseguindo produzir obras, umas melhores que outras naturalmente, mas vão conseguindo ser um pequeno repositório do conhecimento local. Um sistema tão esforçado tem dificuldade quando os projectos são mais complexos, não tendo capacidade operacional para os executar. Aí teremos de voltar às autarquias e ao poder central.
No caso concreto de Alcobaça deveríamos todos ressuscitar ideia, reformulando o que houver para reformular, definindo prioridades e consequentes intervenções. Com um mosteiro com uma nova alma e boas relações com a autarquia está criado um quadro que não existia há muitos anos.

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